Thiago Kuerques é iguaçuano. Contista,
cronista, poeta, escritor e turismólogo, ele tem publicado os livros A Balada
do Esquecido, O Cara Que Não Publicava Livros, Ensaio dos Poemas Pelados e
Território. O escritor falou ao Tomo Literário sobre seu contato com a
literatura, a construção dos personagens de A Balada do Esquecido e a emoção
provocada pelas músicas que fazem parte da trama. Contou-nos ainda sobre novos projetos,
sua visão sobre o mercado literário brasileiro e muito mais. Confira a
entrevista.
Tomo
Literário:
Como
foi o seu primeiro contato com a literatura e como você se descobriu escritor?
Thiago
Kuerques:
Na infância lia gibis da Turma da Mônica e quando ganhei um Almanaque da Turma
fiquei encantado. Depois com Machado de Assis na escola, aos onze ou doze anos.
Demorei a entender que a revistinha também era literatura. Contato com Machado
foi comum. O atípico foi gostar já que normalmente isso nessa fase da vida faz
com que a literatura seja vista como algo difícil e afasta as pessoas.
Tomo Literário:
A Balada do Esquecido, publicado pela
Luva Editora, tem a história de um homem que está em busca de seu lugar no
mundo. Como surgiu a ideia desse livro?
Thiago
Kuerques:
Foram alguns gatilhos para iniciar essa história. Primeiro queria contar algo
que tocasse quase todos ao redor e nada melhor que as incertezas dos nossos
dias. Quis trazer os questionamentos internos e sociais. Sempre fui fascinado
pela falta de memória, não saber de onde veio, o que aconteceu, para onde
seguir. A sequência temporal da vida é tão natural que não percebemos a
importância. E, por fim, o debate sobre temas muito relevantes como racismo,
meritocracia, segregação social e racionalidade usando como escape e resgates
trechos de ambientação no Uruguai e músicas impactantes.
Tomo
Literário:
Como
foi o processo de pesquisa para construção da trama e dos personagens?
Thiago
Kuerques:
Experimentar um romance era um desejo antigo. Sou mais da praia dos contos, mas
tenho uma personalidade de escritor abusado. Criei, por exemplo, uma data de
nascimento e usei mapa astral para criação das personalidades dos personagens.
Não preciso acreditar nisso. Mas, convenhamos, são modelos disponíveis. Fui
moldando antes de começar a escrever. Nuno, o protagonista, é o que mais se
transforma durante a trama. Flor, outra personagem cativante, precisava não ser
apenas a companheira decorativa.
Fiz fichas para os personagens com dimensões
físicas, traumas, características marcantes, desejos, entre outros. Nas minhas
obras coloco muitas reflexões, então fiz muitas anotações importantes antes de
começar. Falas políticas, trechos de músicas, pensamentos sobre questões
contemporâneas. Tudo para que os personagens e a história pudessem ser
confundidas com a realidade.
Tomo
Literário:
As
músicas que são mencionadas em A Balada do Esquecido de algum modo também mexem
com a sua emoção?
Thiago
Kuerques:
Meus dias só funcionam se eu inicio escutando alguma música. Pus essa relação
para os personagens. Quando escrevi o Território fiz um conto baseado na música
Chão de Giz, do Zé Ramalho. Fiquei tão feliz com o resultado que resolvi
colocar mais músicas em um livro novo. Algumas não mexiam comigo antes de ter
colocado no livro. Agora todas, de certa forma, fazem parte também da minha
história. Tanto que criei uma lista para quem quiser ouvir mesmo sem ter o
livro.
Tomo
Literário:
Você
também é cronista, contista e poeta. Como é transitar em gêneros distintos na
literatura?
Thiago
Kuerques:
Quando decidi ser escritor queria não ser simples. Como meu amigo Marcelino
Freire, pernambucano, diz: todo escritor deveria começar na poesia. É uma
grande escola e nos torna mais íntimos das palavras. Foi assim, na timidez e
nas paixões da juventude, que comecei. Me impus a experimentar métodos e
linguagens. Por isso naveguei pela crônica (publico semanalmente em meu site),
pelo conto e agora pelo romance. Ainda irei mais profundamente para o roteiro e
tenho vontade de enveredar pelas HQs. Me sinto assim um escritor maior e
melhor. Não sei ficar parado.
Tomo
Literário: O Cara Que Não Publicava
Livros, Ensaio dos Poemas Pelados, Território e A Balada do Esquecido são
livros que você tem publicado. Qual deles define melhor o seu estilo de
escrita?
Thiago
Kuerques:
O Cara Que Não Publicava Livros foi um risco já que reuni textos que publicava
na internet para um livro de bolso sem ter noção de que eu valia a pena ser
lido. O Ensaio foi uma tentativa orgulhosa de registrar a poesia. Já o
Território foi o meu grande xodó, o que mudou a minha vida e com o qual o
relacionamento é mais íntimo. Afinal, foi nele que consegui tocar as pessoas
falando sobre uma Baixada pulsante para pessoas da região e de outros lugares
do mundo.
Tomo
Literário:
Como
você vê atualmente o mercado literário brasileiro?
Thiago
Kuerques:
Em intensa transformação. O Tomo Literário, por exemplo, é uma das esperanças.
Assim como canais de resenhas no Youtube, saraus, entre outros. O mercado
editorial, formal, está se transformando. Editoras tradicionais estão em forte
crise. As grandes livrarias se transformam cada vez mais em lojas enormes e de
variedades. Por outro lado, acredito que a leitura tem angariado mais pessoas,
temos um número cada vez maior de escritores. Eventos literários estão
habitando locais cada vez mais diversos. É claro que, do ponto de vista
individual, é difícil. Vender um livro é uma tarefa difícil. O escritor tem de
se desdobrar em escrever, ser criativo com a capa, com a divulgação e saber
vender. O mais importante é seguir. Não posso reclamar da Bienal dar espaço
amplo para livros de celebridades da internet. Também não posso reclamar das
modas literárias. O que posso fazer como escritor é jogar o jogo e escrever da
melhor maneira possível. Minha primeira responsabilidade é com o texto. O que
vem em seguida é aprendizado. Por isso realizo oficinas, faço palestras
gratuitas em escolas e bibliotecas comunitárias. Aprendi com Moduan Matus que a
arte tem que estar na rua, no dia a dia, e não presa em salas de gente que
alimenta o próprio ego com intelectualidade estéril.
Tomo
Literário:
De
modo geral o que te inspira a escrever?
Thiago
Kuerques:
O incômodo, os traumas e as esperanças. No livro A Balada do Esquecido criei
uma história que se passa em 2020 e traz um roteiro de esperança em meio ao
caos. Em Território temas como fascismo, extremismo estão presentes. Mas também
relações familiares, educação, relacionamentos abusivos (entre casais e outros
tipos de relações) também fazem parte. O que me incomoda e o que me fascina são
as coisas que pedem diariamente para ser textos. Outro dia vi uma criança
falando em “fake news”. Ali nasceu uma crônica sobre valorização das palavras
mais bonitas da nossa língua, por exemplo.
Tomo
Literário:
Você
está preparando algum novo projeto literário? Pode nos adiantar alguma
informação?
Thiago
Kuerques:
Escrevi uma história que desejo que se torna um livro infanto-juvenil. Tenho
desejo de escrever histórias infantis, mas acho que só quando eu tiver um filho
por perto. Mas, por agora, tenho me dedicado a um novo romance, a um livro de
crônicas que tratem de temas espinhosos com leveza e um livro de contos que
tratem de um futurismo cada vez mais palpável.
Tomo
Literário:
Quais são os autores que você admira ou
que de alguma forma influenciaram o seu trabalho como escritor?
Thiago
Kuerques:
Antes de ser escritor sou leitor. Devorei Machado de Assis e acredito ter muito
da fina ironia dele. Lógico, não chego aos pés. Com um olhar anacrônico, sou
muito fã da obra de Nelson Rodrigues. Também de Millôr Fernandes, Marçal
Aquino, Daniel Galera, Luis Fernando Veríssimo, Marcelino Freire, Ariano
Suassuna e Rubem Fonseca. Admiro de perto as obras do meu amigo Jonatan
Magella. Dos estrangeiros admiro demais Eduardo Galeano, Haruki Murakami,
Gabriel Garcia Marquez, Eric Hobsbawm, José Saramago e Zygmunt Bauman.
Tomo
Literário:
Que
livros, de quaisquer gêneros, você recomendaria aos leitores? Está lendo algum
atualmente?
Thiago
Kuerques:
Recomendaria o livro Eu Receberia As Piores Notícias de Seus Lindos Lábios, de
Marçal Aquino; Contos Negreiros, de Marcelino Freire, Se Eu Fechar Os Olhos
Agora, do Edney Silvestre; e Ostra Feliz Não Faz Pérola, do Rubem Alves.
Tomo
Literário:
Gostaria
de deixar algum comentário para os leitores do blog?
Thiago
Kuerques:
Amigos, peço que prestigiem os autores que vocês admiram. Não deixem os livros
terminarem em vocês. Falem sobre, compartilhem e, se der, comprem livros dos
seus próximos também. É muito gostoso ter como falar sobre a obra com o próprio
autor. Nós aprendemos, vocês se divertem e a arte segue adiante. No mais,
parabéns ao Tomo Literário por ser resistência. Nessa primavera de incêndios em
museus isso é uma flor que vai brotando no meio da história.
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Belíssima entrevista. Parabéns ao Tomo Literário pela fidelidade as palavras do escritor e Parabéns Thiago Kuerques por seu trabalho que se torna tão grandioso pela simplicidade da sua alma. Abraços e pé no caminho sempre.
ResponderExcluirBelíssima entrevista. Parabéns ao Tomo Literário pela fidelidade as palavras do escritor e Parabéns Thiago Kuerques por seu trabalho que se torna tão grandioso pela simplicidade da sua alma. Abraços e pé no caminho sempre.
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