Reflexão: A importância das bibliotecas escolares - Tomo Literário

Reflexão: A importância das bibliotecas escolares

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O IPL – Instituto Pró-Livro realizou em 2019 a Pesquisa Retratos da Leitura em Bibliotecas Escolares. A pesquisa foi encomendada ao Insper – Instituto de Ensino e Pesquisa e realizada em campo pela Oppen Social.

O objetivo da pesquisa foi avaliar o impacto das bibliotecas na aprendizagem dos alunos da Educação Básica e verificar se são garantidos os parâmetros para seu funcionamento e instalação, de modo a orientar a universalização das bibliotecas. A consulta foi realizada em 500 escolas, localizadas em 260 municípios brasileiros e em 17 estados.

O público pesquisado para coleta de dados foi o diretor ou diretora da escola, um professor ou professora de português e aquele ou aquela responsável pela sala de leitura. A metodologia utilizada foi um questionário com mais de sessenta questões que foram direcionados a cada um dos profissionais respondentes.

Do público que costuma ler livros emprestados em bibliotecas escolares, temos 36% de 05 a 10 anos, 48% de 11 a 13 anos, 32% do público de 17 a 24 anos e 18% da população em geral.

Não basta distribuir livros se não forem garantidas outras condições para o pleno funcionamento das bibliotecas escolares e espaços de leitura integrados ao currículo escolar. Com a pesquisa realizada pelo IPL esperávamos ter muito mais visibilidade e que tal pesquisa servisse como orientação de políticas, programas e  ações de investimentos voltados à melhoria da qualidade das bibliotecas escolares e ao alcance dos objetivos de aprendizagem integrados ao currículo escolar.

Os dados por si só despertam reflexões sobre como as bibliotecas escolares são tratadas. Há muitas instituições que não contam com a presença de um bibliotecário, profissional indispensável que zela pela manutenção dos livros, registros das obras e acompanhamento do acervo. Essa tarefa, em algumas instituições, fica a cargo de um funcionário da secretaria escolar que acumula funções. Há outras instituições que não possuem bibliotecas, tampouco espaços de leitura. E, o mais gritante, são os casos em que sequer há, na grade curricular, alguma orientação ao docente para que incentive a leitura.

A biblioteca escolar é uma poderosa ferramenta de acesso aos livros e facilitadora, portanto, da prática leitora de alunos da rede pública e/ou particular.



Correlação da pesquisa com o SAEB

A Pesquisa Retratos da Leitura em Bibliotecas Escolares fez uma correlação de seus indicadores com os índices obtidos no Saeb. O Sistema de Avaliação da Educação Básica é um conjunto de avaliações realizadas em larga escala que permite ao Inep - Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira apresentar um diagnóstico da educação básica brasileira e de fatores que podem interferir no desempenho do estudante. São feitos testes e questionários, a cada dois anos, na rede pública e em uma amostra da rede privada.

O Saeb reflete os níveis de aprendizagem demonstrados pelos estudantes avaliados, explicando esses resultados a partir de uma série de informações contextuais que são analisadas pelos realizadores da pesquisa.

A análise de indicadores mostra correlação com desempenho em português. A escola que tem uma biblioteca em funcionamento, com um responsável pela biblioteca e/ou sala de leitura, que tenha atuação de um professor que fomente a leitura e cuja biblioteca tenha recursos eletrônicos, apresenta relevância no desempenho, logo quatro dos sete indicadores trabalhados na pesquisa estão fortemente ligados com a melhoria no desempenho dos alunos em português.

Para as escolas mais vulneráveis, ou seja, aquelas em que se concentram os estudantes de menor renda, o índice de desempenho dos alunos melhora acima do índice daqueles que frequentam as escolas menos vulneráveis.

Veja-se que aqui temos uma ratificação de que a leitura é um redutor de desigualdade social. Os alunos que são de escolas mais pobres melhoram significativamente o seu desempenho em português e matemática, indicador que para os alunos menos vulneráveis também melhora, mas em menor significância.

Esses últimos, certamente, chegam na escola com um capital cultural maior e mais acesso a atividades sociais e bens culturais, enquanto aqueles, os mais pobres, não tem acesso a uma série de aparatos que aumentam o repertório do aluno. A leitura, portanto, revela-se como um mecanismo de libertação e promoção do protagonismo do indivíduo com conhecimento e acesso à cultura. O que devemos enfrentar é a manutenção do status quo, fato preocupante se não entendermos essa necessidade de dar subsídios aos alunos para que tenham mais e melhores acessos aos livros.

Precisamos refletir ainda sobre a condição do aluno que chega à sala de aula. Muitos tem que lutar contra a fome, enquanto tem que se dedicar aos estudos. Todo o contexto social, político e histórico deve ser analisado para as ações nas bibliotecas e para o fomento da leitura.

O desempenho dos alunos não melhora apenas em Português, disciplina que atua diretamente com a leitura e a produção textual na língua pátria, mas melhora também em matemática. Isso se explica pelo fato de que um aluno que lê mais, aumenta seu repertório e sua capacidade de compreensão textual, o que facilita o entendimento do enunciado de problemas e exercícios matemáticos. Ler bem, faz com que o aluno tenha mais capacidade cognitiva e melhor raciocínio lógico sobre a problemática apresentada. Se falamos de português e matemática, não podemos nos restringir apenas a tais disciplinas. Todo docente, seja de que disciplina for, tem um papel importante de incentivo à leitura. Esse cenário foi ratificado pela pesquisa Retratos da Leitura no Brasil, em que o professor apareceu como principal incentivador dos leitores.

Na comparação entre a pior e a melhor escola com relação ao funcionamento da biblioteca, a pesquisa Retratados da Leitura em Bibliotecas Escolares, mostra o desempenho em Português aumenta 5 pontos na escala SAEB, o que equivale a 1/2 ano de aprendizado entre o 5º e 9º anos. Meio ano de aprendizado é bastante relevante.

O indicador de recursos eletrônicos tem correlação positiva e significante de 9 pontos (SAEB) em Português, 10 pontos em Matemática e 0,4 pontos no IDEB – Índice de Desenvolvimento da Educação Básica. O resultado sugere que a presença de um responsável qualificado que cuide da biblioteca e participe das atividades pedagógicas é relevante no aprendizado. A magnitude do efeito em desempenho em Português é de 4 pontos (SAEB), ou seja, 1/3 de um ano de aprendizado entre o 5º e 9º anos. O efeito é mais relevante nas escolas mais vulneráveis: 16 pontos (SAEB).

Para debater e criar políticas públicas de fomento à leitura, é preciso que se conheça a problemática do tema e as duas pesquisas (Retratos da Leitura no Brasil e Retratos da Leitura Bibliotecas Escolares) revelam dados importantes que clarificam o cenário de leitura em território nacional.



Sem dúvida, há urgência de incentivo à leitura e essa deve ser uma das grandes necessidades que enfrentamos no país. É preciso que a sociedade tenha ciência do panorama em que nos encontramos e exija o acesso aos livros. Instituições de ensino, professores, diretores de escola e outros agentes podem e devem se mobilizar no sentido de pleitear que a leitura seja trabalhada no ambiente escolar e fora dele. A leitura deve ser trabalhada de forma mais ampla. A sociedade, como um todo, tem responsabilidade no pleito de políticas públicas ligadas ao fomento da leitura e da facilitação de acesso aos livros.

Como dito anteriormente, não é a mera distribuição de obras que resolverá o imbróglio, outrossim serão as políticas, os planos, os projetos que visem aparelhar a rede de ensino, mas também de promover outras questões que facilitem o acesso aos livros e que as escolas, suas bibliotecas, salas de leitura, estejam aparelhadas e preparadas para que os alunos possam usufruir dos livros de modo que a informação ali obtida seja trabalhada em sua vida. Novamente, vemos a biblioteca como um local de construção do conhecimento.

No texto “O Direito à Literatura”, Antonio Candido expressa que, “a luta pelos direitos humanos abrange a luta por um estado de coisas em que todos possam ter acesso aos diferentes níveis de cultura. A distinção entre cultura popular e cultura erudita não deve servir para justificar e manter uma separação iníqua, como se do ponto de vista cultural a sociedade fosse dividida em esferas incomunicáveis, dando lugar a dois tipos incomunicáveis de fruidores. Uma sociedade justa pressupõe o respeito dos direitos humanos, e a fruição da arte e da literatura em todas as modalidades e em todos os níveis de um direito inalienável."

Fato é que a biblioteca escolar, como demonstra a pesquisa mencionada, reflete que há melhoria no desempenho dos alunos tanto em português quanto em matemática. Os dados, concretos que são, demonstram a importância da atuação da escola frente ao universo do leitor. Se há melhoria no desempenho, sobretudo para crianças em situação mais vulnerável, nós temos que direcionar e canalizar esforços para que as bibliotecas e a leitura sejam práticas constantes no processo de educação, que visa não somente formar um aluno melhor, mas possibilitar que a sociedade tenha cidadãos melhores e mais informados.

A leitura é um direito do cidadão, é uma forma de democratizar a informação, é um mecanismo redutor de desigualdade social, é um produto que auxilia o aumento do conhecimento e do capital cultural, é uma ferramenta de entretenimento, é libertadora, é promotora do protagonismo e fomenta a cultura. Ler faz bem!

Vamos refletir sobre a leitura no país e, a partir das reflexões, exigir medidas práticas e concretas?

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