“...
não é diante de outro homem inteligente que um homem inteligente tem medo de
parecer burro, não é diante de um grande senhor e sim diante de um grosseirão
que um homem elegante receia ver sua elegância menosprezada.”
Em Busca do Tempo Perdido, conhecida obra do
escritor francês Marcel Proust, considerado um dos maiores escritores do século
XX, é composta de sete volumes. A obra
foi escrita entre 1908 e 1922. No Caminho de Swann é o primeiro desses sete
tomos.
O livro Um Amor de Swann é o segundo capítulo
do primeiro volume. O que permite a sua publicação de maneira isolada é a
independência que o trecho tem de todo o restante do texto de Proust. Originalmente
foi publicado em 1913 e nele reside uma narrativa que não se atrela aos demais,
ainda que seja parte que constitui o todo. Outrossim, vale dizer ao leitor que
Um Amor de Swann é narrado em terceira pessoa, o que diferencia o livro em
questão de todo o restante do texto da obra consagrada. Ainda mais, Um Amor de
Swann, tem publicações independentes já há bastante tempo e virou filme em
1984.
Com tradução de Cristina Cupertino e Daniel
Knight, a Editora Tordesilhas, publicou o livro em 2017, com prefácio de
Marcelo Jacques de Moraes – professor titular de literatura francesa da UFRJ.
Em O Amor de Swann temos a história do
aristocrata que dá nome ao livro e Odette, a quem se refere “o amor” do título.
Swann é conhecedor de arte, entre as quais figuram a pintura e a música, que
são abordadas em várias passagens do livro, formando um tripé (pintura, música
e literatura). Seu conhecimento é, sem dúvida, notadamente percebido pelos
demais personagens no meio em que circula, denotando sua inteligência. Aristocrata,
como dito anteriormente, ele freqüenta a alta sociedade francesa, ainda que, de
um jeito ou de outro, haja o despertar da antipatia de outros membros do meio.
Mas, há que se pesar, que tudo é feito para manter o status. As aparências,
ainda que simuladas, são mantidas.
Inicialmente, quando ele conhece Odette,
rechaça a ideia de ter qualquer relação com a mulher. Acha-a, inclusive, quase
feia, uma figura incapaz de despertar interesse. Odette, a mulher que depois
vem a se envolver com Swann, é considerada fútil e tem sua reputação posta em
dúvida. Inclui-se a isso o fato de que ela não faz parte da classe burguesa.
“... acho
ridículo que um homem da inteligência dele sofra por causa de uma mulher
daquele tipo e que ainda por cima nem é interessante”. – Comenta um
personagem acerca de Swann e seu sentimento por Odette.
Ao ver uma pintura de Botticelli na Capela
Sistina ele recorda-se da moça, como que despertando para a possibilidade de
ter com ela algum tipo de relacionamento. Seus sentimentos mudam em relação
aquela primeira impressão que tivera. Em Zéfora ele vê Odette. É como se ela
fosse então elevada a algo sagrado, posto que a obra mencionada está dentro de
um capela. Odette galga, nos sentimentos de Swann, algo mais que a antipatia
inicial. Além do despertar pela pintura, como ocorre nesse encontro dele com
seu sentimento, a música também o toca, e uma sonata passa a aguçar prazer e recordações
em Swann.
Mesmo com aquele desdém inicial, a vida dá
voltas e amarra as pessoas. Ele acaba
amando fervorosamente aquela mulher. O sentimento é nele despertado, de tal
maneira que até ciúme passa a sentir. E isso ocorre não uma vez somente, mas
várias e o coloca em situações inusitadas, mesmo quando provocadas. Podemos
dizer que Swann desenvolve uma grande obsessão por Odette. Em algumas etapas, surgem
suspeitas e ele passa a querer saber o que Odette faz quando está longe dele.
“Mas
era em vão que Swann lhe expunha assim todas as razões que ela tinha para não
mentir; elas teriam podido destruir em Odette um sistema geral de mentira; mas
Odette não possuía um tal sistema; ela se contentava, cada vez que queria
ocultar de Swann alguma coisa que ela tinha feito, em simplesmente não contá-la
para ele. Assim a mentira era para ela um expediente de ordem particular...”
O relacionamento, definido como diabólico e “sem escrúpulos” por Samuel Beckett, é o
centro do livro de Marcel Proust. Mas também são abordados a idealização da
pessoa amada, as máscaras sociais que são utilizadas para parecer o que não se
é e aparentar um status considerado relevante, as articulações que se faz
socialmente para se alcançar objetivos, a frivolidade das classes mais
abastadas, o poderio econômico como cerne das relações e a emoção se sobrepondo
à racionalidade. É nesse ponto que vemos o homem tido como inteligente e rico
se entregando à emoção. Portanto, a obra vai além do simples fato de tratar a
relação de amor entre Swann e Odette, pois se estende à complexidade dos
sentimentos humanos, da vida social de um indivíduo.
Swann perde sua racionalidade e acaba exacerbando
suas atitudes o que mostra claramente, no texto de Marcel Proust, os extremos
do amor. Observa-se também mudanças em Odette que serão reveladas ao longo do
livro.
Proust tem uma narrativa de parágrafos longos
e frases idem. Em meio a densa história de amor há um pitada de humor. Os
personagens do meio em que vive Swann, como o Sr. e a Sra. Verdurin, mostram as
facetas do interesse, do falar às escondidas, do fingimento da simpatia, das
máscaras sociais. Sr. Verdurin, por exemplo, fala sobre Swann que “ele é o típico fracassado, o sujeitinho
invejoso de tudo o que tem um pouco de grandeza”.
Na abertura do livro há a menção de que
trata-se de um livro para adentrar a obra de Proust, e isso é perceptível
quando conseguimos nos identificar com a trama criada por ele. Um Amor de Swann
foi capaz de despertar o desejo pela leitura de mais textos de Proust, de
conhecer mais profundamente seu trabalho.
Interessante observar que trata-se de uma
história de amor realizada no início do século XX, mas que ainda enseja pontos
que são amplamente discutido na sociedade atual. É a prova de que bons textos
conseguem ultrapassar o tempo nos quais foram criados.
Um Amor de Swann é um ótimo livro e traz uma
história que prende a atenção do leitor.
Foto: Reprodução |
Sobre o
autor
Marcel Proust (1871–1922), filho de uma
abastada família parisiense, frequenta os salões mais badalados da capital
francesa e leva uma vida social dinâmica. Ao fim do século XIX, abalado pelo
diagnóstico de asma crônica e pela morte da mãe, passa a viver extremamente
recluso, dedicando a maioria do tempo à composição de Em busca do tempo
perdido. Ficou famoso sobretudo pela inovação estilística e linguística de sua
prosa, assim como pela franqueza e pelo tino com que lidou com temas como amor,
política e homossexualidade.
Ficha Técnica
Título: Um Amor de Swann
Escritor: Marcel Proust
Editora: Tordesilhas
Edição: 1ª
ISBN: 978-85-8419-052-2
Número
de Páginas:
300
Ano: 2017
Assunto: Ficção francesa
Fiquei curiosíssima, mas pressinto que ainda não estou preparada para algo tão denso.
ResponderExcluirExcelente resenha. Deu até vontade de conhecer todos os volumes de Em Busca do Tempo Perdido.
ResponderExcluirAchei o texto complicado, normalmente ao ler imagino como teria sido a cena e neste livro me vi dispersa por inúmeras vezes.
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