Simetria. Uma pessoa que tenha algum transtorno ligado à simetria, tem a
sensação de que coisas ruins podem acontecer se algo estiver fora do lugar. Por
vezes, os pensamentos negativos que tomam conta da pessoa e as atitudes que tem
são inexplicáveis, no entanto, parece ser a forma que encontra para aliviar e
se ver livre dos pensamentos obsessivos.
O prólogo da obra de Renata Maggessi, O Enterro dos Ossos, nos leva ao
ano de 1981 numa casa alugada no Recreio dos Bandeirantes, bairro da Zona Oeste
do Rio de Janeiro. O cão de Eliseu – ainda criança – brincava no jardim. Hulk
cavou o terreno e encontrou “algo sujo”.
A constatação dos pais do menino, Sérgio e Luisa, logo veio: aquilo era um osso
humano.
A história tem uma passagem de tempo quando começamos o capítulo primeiro
da obra. Tem início no ano de 2009 – setembro daquele ano. O corpo de uma
mulher é encontrado na areia da praia, por Caio e seus amigos.
“...o assassino tentou copiar a tatuagem do tornozelo direito no
esquerdo. Observe as linhas. Perceba como elas são parecidas. O mesmo aconteceu
com a bochecha. Ela tinha uma pinta na bochecha esquerda. O meliante “criou”
uma pinta na bochecha direita (...) É óbvio que esse cara tem problema com
simetria.”
Outros crimes ocorrem e ossos são encontrados. Tudo indica que nos crimes
há violência sexual contra a vítima e que seu executor tem fixação por
simetria. Sua obsessão por perfeição se revela na sua ação criminosa, como quem
busca corrigir um erro de quem, para ele, é imperfeito. Marcas, incisões,
tatuagens, podem ser feitas para dar ao corpo “imperfeito” a simetria necessária para satisfazer o distúrbio do
assassino.
Diante do cenário de crimes que ocorrem, não faltam também questões que
envolvam as relações humanas. Benjamin, personagem que assume o protagonismo,
se vê novamente tocado por uma ex-namorada. Luana o procura anos depois do
rompimento da relação, mas o seu passado esconde alguns fatos desconhecidos
pelo ex-namorado. Por Benjamin o leitor acompanha também uma história de
encontros e desencontros, que se travam por meio dos relacionamentos que ele
constitui.
Vale mencionar que a vida dos personagens, ou pelo menos de boa parte
deles, se cruza, como perceberá o leitor logo no início, formando uma teia de
relações que levantam dúvidas, expões aflições e traumas de alguns personagens,
conecta-os a eventos presentes e passados. Esse emaranhado de relações cria uma
trama que requer atenção do leitor para sacar as entrelinhas do que vai sendo
revelado e contado pela autora de forma natural (sem alardes), dando
continuidade e seguindo a trajetória da história que se propôs a contar.
“E o pior é que não há indícios de quem seja o assassino. O cara não
deixa rastros...”
O Enterro dos Ossos, da escritora Renata Maggessi, foi publicado pela
Editora Coerência em 2018 (246 páginas). A autora nos brinda com uma trama
policial, que se passa no Brasil, e que traz personagens que, além de serem
ligados aos crimes (pelas relações ou por se envolverem nas investigações),
carregam seus conflitos pessoais.
Interessante observarmos que Renata Maggessi usa de um recurso que
desperta a curiosidade do leitor. Em dado momento as impressões sobre o
psicopata e a sua identidade são apresentadas a quem lê, mas há informações que
vão surgindo e dando corpo à história. Adentramos então, duas vertentes: de um
lado a visão de quem busca pelo assassino e de outro o criminoso e sua obsessão
pela simetria na execução dos crimes. Revelar o nome do assassino ao leitor é
uma jogada arriscada, mas Renata consegue manter o clima de tensão do livro e
traz reviravoltas e acontecimentos que atiçam a curiosidade do leitor.
Tramas policiais me atraem e o livro objeto da resenha, me fisgou. A
escritora ambienta a história em seu tempo. Temos referências a situações e
costumes contemporâneos, tais como músicas e o uso de aplicativo de mensagens.
No que refere-se ao espaço temporal, temos um salto inicial, como foi
mencionado anteriormente, que vai do prólogo ao capítulo primeiro. Depois temos
mais um novo avanço no tempo, de oito anos.
O Enterro dos Ossos é uma trama e tanto, que prende a atenção de quem lê
e consegue nos confundir e fascinar. Os diálogos são usuais e dão agilidade ao
desenrolar da história, mesmo trazendo detalhes cotidianos dos personagens. As
cenas curtas se intercalam como um quebra-cabeça que vai sendo montado, até
chegarmos ao desfecho.
Não posso deixar de comentar sobre a capa, que nos coloca em total
sintonia com o conteúdo do livro, atraindo a atenção do leitor. Além disso, as
páginas também receberam acabamento com adornos e um crânio na numeração das páginas.
Instigante.
É um livro para te prender – simetricamente – do início ao fim, que usa
de um jogo interessante com o leitor ao deixar o assassino exposto, mas tratar
das ligações que se cruzam e que revelam muito dos personagens. Renata
apresenta um primeiro romance de uma escritora que promete boas tramas para os
leitores. Que venham mais!
Sobre a
autora
Renata Maggessi é jornalista e pós-graduada
em Literatura Brasileira pela UERJ. Carioca, escolheu a cidade de São Paulo
como morada, onde vive com seu marido e sua filha. Apaixonada por tudo o que
envolve escrita e leitura, iniciou sua carreira literária a partir de diversas
publicações em antologias de contos, a maioria de terror e suspense. É membro
da ABERST (Associação Brasileira dos Escritores de Romance Policial, Suspense e
Terror) desde janeiro de 2018. O Enterro dos Ossos é seu primeiro livro solo
publicado.
Ficha
Técnica
Título: O Enterro dos Ossos
Escritor: Renata Maggessi
Editora: Coerência
Edição: 1ª
Número
de Páginas:
246
ISBN: 978-85-5327-072-9
Ano: 2018
Assunto: Literatura policial
brasileira
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